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A Igreja não reconhece o seu Pastor

     Desde os tempos mais remotos, mesmo diante das mais fortes evidências do Bem, a amizade do homem com Deus sempre foi frágil, pois, na presença do Santissimo, os propósitos humanos, embora cheios de nobrezas, são embebidos no próprio egoísmo e cobiça, como herança da raiz de Adão, que cedeu à mentira, por isso, mesmo de frente com o Pastor, seus amigos não o reconhecem: “chegada a manhã, Jesus apresentou-se na praia; os discípulos todavia não conheceram que era Jesus” (Jo 21,4)[1].
     Assim, o homem diz querer fazer o bem, se propõe a fazer o bem, mas pratica o mal: “Com efeito, nós sabemos que a lei é espiritual, mas eu sou carnal, vendido ao pecado. Em verdade, não entendo o que faço; não faço o bem que quero, mas faço o mal que não quero (Rm 7, 14-15)[2).
    E isso se repete nos tempos presentes, os empregados de Deus, seja de que religião for, os discípulos de Jesus, pregam o bem, falam do bem, mas não praticam o que pregam, nem o que falam, porque a ciência que há neles é a da insanidade humana, insana porque agarrada ao visível, à criatura, ao positivo, e não à sagacidade do Espírito onde repousa a Amizade, em outras palavras, eu controlo, eu faço, quando deveria ser “é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20), e com isso, ao invés de se testemunhar a Verdade, o que se vê são as cobranças para o reconhecimento das obras pessoais de cada um, como por exemplo, o direito autoral daquela canção, ou daquele livro, ou daquela campanha, ou, ainda, a memória daquele ilustre.
    Assim, o homem embebido em seu egoísmo e cobiça, apropria-se do indébito, usurpando dos bens divinos dizendo ser ele o seu senhor, pois lhe é legalmente (pela lei humana) reconhecido o domínio pessoal, quando na verdade, por si só, não é capaz de nada, o poder, a sabedoria, o domínio não é dele, mas de seu Amigo que a ele confiou os bens.
    Um exemplo disso que se pode trazer para esses tempos presentes, é quando se olha para os empregados de Deus, e se vê uns que se intitulam servos, ou  a serviço do Cristo, mas ao invés de imitar Cristo, servem ao dinheiro, e usam seu atributos místicos para explorar a mitologia (Deus sem o testemunho da Palavra) no povo, vendendo contratos de entretenimentos recheados de cachês de 80, 100 mil, e nem o céu é o limite, talvez o inferno seja, ora em megashows ao vivo,  em arenas ou casa artísticas, ou programas televisivos, que, muito distante de compartilhar a Verdade, envergonham Deus com tanta mediocridade e ilusão de espírito, em atos vazios e profanos.
    Lembro um outro caso real, em que ocorrido um milagre pela intercessão de um Santo, a ovelhinha beneficiada vai a “causa dos santos” testemunhar a Palavra para que seja registrada no processo de beatificação, e lá alguém lhe diz para voltar outro dia, pois achar o responsável pelo registro, é um questão de sorte, porque ele estaria viajando, e já tem outra viagem marcada para a mesma semana, o que nos remete aos post das redes sociais, em que se vê os que dizem servos, postando fotos paradisíacas na neve, na montanha, nos centro das grandes cidades do Mundo, sob canastras mensagens de que estão em missão, regadas a ricos passeios, ostentando mobiles que custam mais de 8 mil reais, bancados pelos dízimos dos fiéis.
    Assim, ao invés de revelar o Cristo, testemunham o luxo, a ilusão do mundo, o poder do homem, cujo deus é o dinheiro, e quando voltam, como não vivenciaram a Palavra, suas pregações são apenas mito ou fábulas, porque a sua amizade não é com o Senhor mas com o dinheiro, e todo o investimento dos fiéis foram inúteis, pois não lhe é compartilhado pelo financiando, nenhum benefício ou privilégio.
    Essa mitologia é uma projeção da vaidade humana que inverte a condição humana de Jesus que ao invés de reconhecer o Divino como Amigo no meio dos homens, O rebaixa à mediocridade humana com uma frase de efeito sem o real sentido da Verdade, quando se diz: “Ele é como um de nós, menos no pecado”, da mesma forma  com o Pai é figurado como um velhinho do lado esquerdo de Jesus.
     Essa herança de morte, não é característica de um homem, ou da Igreja Católica atual, ela é a marca da morte que cada um carrega em si, como é possível se ver desde o tempo de Davi, quando Natã lhe pede uma sentença sobre o homem muito rico que cheio de rebanhos, retirou a única ovelha de um pobre que só tinha aquele bem, cuja sentença foi imediata, “seja lhe aplicada a pena de morte, e restituído o quádruplo”, então Natan lhe revela que aquele criminoso era o próprio Davi, cuja vítima tinha sido Urias (2Sm 12, 1-7).
     O deus mitológico nos faz ver que as coisas são bonitas, mas a prática delas deve ser feita na órbita externa, nunca em nós mesmos, diferente do Deus vivo, que é presente em cada ato que praticamos, e muitas vezes nos parece até ser contrário às nossas vontades, assim, é o cidadão comum que critica o político corrupto, ou o juiz ladrão, mas em sua casa, tem o software pirata, o DVD pirata, o aparelho que quebra o lacre da TV por assinatura, o amigo que é padrinho do seu filho no trabalho, ou seja, tanto o juiz e o político pensam como o próprio cidadão comum, e todos toleram a corrupção, se se quer mudar, tem de  se começar por si próprio, não cobrando dos outros.
     Se queremos a Vida, temos de optar pela Vida, e essa opção tem como condição o esvaziamento de si próprio para dar lugar ao Cristo que assume a direção (Mt 16,24), e essa renúncia significa ser honesto consigo mesmo, pois, muitas vezes, no cotiano se age como se estivesse na mais pura harmonia com Deus quando na verdade, O está desprezando.
    Vou trazer aqui um caso real em uma Comunidade em São José dos Campos-SP, mas tenho certeza, aconteceria a mesma coisa em qualquer outra, cujo o problema é o seguinte, sendo a Pastoral da Família uma das pastorais que mais pregam a defesa da família, Deus lhe deu uma missão,  a de socorrer uma pai, membro daquela Comunidade, que precisava de um lugar para receber o filho no dia de visitas definidos pelo Tribunal de Justiça, para que não tivesse contato com a mãe que tem problemas psicológicos.
     O pai procurou a pastoral, que encaminhou para o vigário, que encaminhou para o pároco que por sua vez, estava em viagem sem missão declarada, e não poderia atender. Diante da dificuldade, tentou uma segunda Comunidade que da mesma forma, esquivou-se do problema e encaminhou para o Bispo, que por não estar disponível, a secretaria responsabilizou-se por agendar uma data e comunicar posteriormente, o que nunca ocorreu.
     Essa prática não é novidade, ela ocorreu também no tempo de Jesus, que diante da proficiência da Verdade, Ele foi enviado para o sumo sacerdote, que por sua vez, enviou para Pilatos, que por sua vez, encaminhou para Herodes que, em razão disso até voltou a amizade com Pilatos, e devolveu Jesus a ele que lhe revelou ser o testemunho da Verdade (Jo 18, 12-40), mas, Pilatos servia aos homens e não à Verdade.
      Assim, como nos tempos dos fariseus, continua nos tempos presentes o mesmo  farisaísmo, onde se prega uma palavra bonita sob a lei do amor, mas não se ama, não vive o amor, fala-se em Eucaristia, mas o pão da Palavra é enterrado na indiferença, como farão com este texto, no isolamento, no individualismo, e o testemunho da Verdade é apenas uma fábula de Apolíneo e Dionísico, como disse Nietzsche ao afirmar se tratar de um deus morto, e de fato, esse culto é de um deus morto, onde a Igreja não reconhece o seu Pastor, pois, permanece nos milenares cultos farisaicos, cheios de ostentação por fora e mortos por dentro, distante da amizade com Deus.
      Mas o Deus vivo dá aos seus amigos a Graça de se tornarem amigos, e só Ele sabe quem são os seus amigos.


[1] Bíblia Vulgada. 47ª. Ed. São Paulo: Paulinas, p.1.181.
[2] Bíblia Vulgada. 47ª. Ed. São Paulo: Paulinas, p.1.239.

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