A
liturgia desta sexta-feira santa vem tratar da santificação da
humanidade em que Deus, fiel à amizade com o homem, se põe como
homem, mas, ao invés de ser recebido como amigo, é submetido à
desumanidade através da dor e humilhação:
“Não tinha beleza nem atrativo para o olharmos, não tinha aparência que nos agradasse. Era desprezado como o último dos mortais, homem coberto de dores, cheio de sofrimentos; passando por ele, tapávamos o rosto; tão desprezível era, não fazíamos caso dele” (Is 53, 2b-3).
Sofre
esta dor porque se iguala à mesma condição de seus semelhantes que
sofrem pelo tratamento desumano, vítimas da sede de poder e cobiça,
por isso, são multilados, assassinados, maltratados, explorados,
humilhados: “a verdade é que ele tomava sobre si nossas
enfermidades e sofria, ele mesmo, nossas dores; e nós pensávamos
fosse um chagado, golpeado por Deus e humilhado!” (Is 53,4).
Quando
olhamos para a humanidade vemos uma característica que diferencia o
homem de todos os outros animais, pois, é pela humanidade que ele
cria incríveis artes, ao ponto de parecerem divinas, ou ainda, se
aprofunda na ciência capaz de enviar sondas para outras galáxias,
ou, conseguir a percepção do desenho do próprio universo. A
nenhuma outra criatura, que embora também carregue em si
conhecimentos, foi dado esse dom, o dom de se equiparar a Deus, pela
imagem e semelhança.
Mas
esta jóia rara no universo, se mantém viva pela força da amizade
entre o homem e Deus, pois a partir do momento em que o homem se
afasta de Deus, ele perde sua humanidade e ao invés da arte, seus
frutos criam a desumanidade.
Ao
classificarmos a desumanidade na forma comportamental dos seres
viventes, ela não se classifica com a arte dívina da humanidade,
também não se classifica com o comportamento natural dos animais
que seguem a natureza de Deus, mas segue um coração transviado pela
maldade, cobiça, ciúme, rancor, inveja, portanto, o pior de todos
os comportamentos.
E
a desumanidade se impõe sobre a humanidade de forma que nenhum lugar
se encontra livre dela ou de suas armadilhas, e nenhum descendente de
homem deixou de experimentar algumas dessas armadilhas: Quem de nós
deu crédito ao que ouvimos? E a quem foi dado reconhecer a força do
Senhor? (Is 53,1).
Com
isso, muito a adotam como preceitos de vidas, outros a vomitam, outros
são indiferentes, o fato é que ela, na sua infidelidade ao homem, o
instiga à prevalência da desumanidade sobre a humanidade, e, com
isso, nos dias de hoje a amizade de Deus parece uma fantasia, algo
“sem graça” pois não tem a mesma interação ou o vigor da
desumanidade na vida do homem, que o leva a gostar de trair, de
matar, de possuir, de ser deus, de permanecer no ócio, de se iludir
no prazer: “Tornei-me o opróbrio do inimigo, o desprezo e zombaria
dos vizinhos, e objeto de pavor para os amigos; fogem de mim os que
me veem pela rua! Os corações me esqueceram como um morto, e
tornei-me como um vaso despedaçado (Sl 30,2).
Mas
à fidelidade da amizade entre Deus e a humanidade o leva a se
colocar junto com aqueles que são seus, aqueles que querem se
libertarem da desumanidade e buscam a humanidade: “Com efeito,
temos um Sumo Sacerdote capaz de se compadecer de nossas fraquezas,
pois ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do
pecado” (Hb 4,15), assim, sendo Deus, se rebaixa à condição de
homem e, fiel à humanidade, sofre todo tratamento desumano daqueles
que rejeitam esta humanidade: foi maltratado, e submeteu-se, não
abriu a boca; como cordeiro levado ao matadouro ou como ovelha diante
dos que a tosquiam, ele não abriu a boca” (Is 53,7).
Não
abandonou aqueles que são seus, não abandou aqueles que vivem pela
humanidade: “e por causa do pecado do meu povo foi golpeado
até morrer (Is 53,8c), sendo
Deus, trouxe para este mundo a divindade, do início e fim, do
passado ao presente das
alturas (∂Ω),
do início e fim, do
presente para o futuro das
alturas (∂Ω),
do início e fim do passado
ao presente da
Terra (∂Ω)
e do início e fim do presente para o futuro da
terra
(∂Ω),
simbolizada pela cruz
(†): Eu nasci e vim
ao mundo para isto:
para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta
a minha voz” (Jo 18,37).
Mas,
da magnitude do esplendor de sua grandeza da cruz, Ele rejeitou ficar
separado do humanidade: “Jesus tomou a cruz sobre si e saiu
para o lugar chamado “Calvário”, em hebraico “Gólgota” (Jo
19,17), e por seu
sacrifício santificou a humanidade elevando-a à divindade da Cruz:
“Oferecendo sua vida
em expiação, ele terá
descendência duradoura, e fará cumprir com êxito a vontade do
Senhor. Por esta vida de sofrimento, alcançará luz e uma ciência
perfeita” (Is
53,10b-11), fundindo
seu corpo humano com cravos em Deus, pelo sangue, pela dor, mas,
sobretudo, por um abraço de Amor entre o homem e Deus, que
santificou a humanidade, ou, tornou santos aqueles que são humanos:
“Meu servo, o justo,
fará justos inúmeros homens, carregando sobre si suas culpas”.
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